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CRIMINOSOS METRALHAM CASA DE AGENTES PENINTENCIÁRIOS EM FORTALEZA CE

                                                    FOTO MERAMENTE ILUSTRATIVA A residência de dois agentes penitenciários, incluindo u...

CEARÁ TEM 21 DETENTOS GBTS EM PENITENCIÁRIA ESPECIALIZADA


Os GBTs são 21 dentre os 138 internos da Unidade Prisional Irmã Imelda, a primeira destinada a esse público no Brasil. O espaço é dividido com outros perfis vulneráveis
'Novinha', como escolheu ser chamada, cumpre pena de 3 anos e 8 meses por tráfico. Ela esteve em três outras Unidades Prisionais ( Fotos: Natinho Rodrigues )
Está na Bíblia Sagrada, Deus disse ao povo judeu: A cada sete anos, as dívidas deveriam ser perdoadas. O cálculo na 'Lei dos Homens' é outro. Até pagar tudo o que deve, 'Novinha' (nome social), 21, ainda tem mais um ano e meio, mas não em casa. Em julho de 2016, ela se mudou para o quilômetro 27 da BR-116, no município de Aquiraz. Foi a Justiça quem determinou. Seu débito é com a sociedade.
A Unidade Prisional Irmã Imelda Lima Pontes é seu atual endereço, mesmo sem cheiro de lar ou abraço diário da mãe. A Penitenciária, com um ano e três meses de funcionamento, conta com 140 vagas. Delas, 138 estão ocupadas. "Trabalhamos para que essas outras vagas não sejam preenchidas", explica a secretária de Justiça e Cidadania do Estado do Ceará (Sejus), Socorro França. "Um olhar humanizado a essa população carcerária, que é diferente, é o que oferecemos", pontua.
Das 1.423 prisões no Brasil, apenas 100 (7%) possuem alas destinadas ao público LGBT. A Irmã Imelda é a primeira unidade com esse objetivo em todo o País. Em um relatório da organização americana 'Black & Pink' sobre o encarceramento dessa população, denominado 'Coming Out Concrete Closets', de 2015, dos 1.200 presos LGBTs ouvidos, todos relataram experiências de violência sexual.
"A Irmã Imelda só aconteceu a partir de uma demanda do próprio movimento LGBT, reconhecendo a gravidade que era a vivência desse público em outras unidades. É um avanço na dívida histórica que o Estado tem com esse público", pondera Narciso Junior, da Coordenadoria Especial de Políticas Públicas para LGBT do Estado do Ceará.
Tudo dividido
'Novinha' não tem mais contato com quem ficou do lado de fora. Antes, trabalhava vendendo chips telefônicos. "Eu tinha uma vida normal. Não precisava ter feito isso", desabafa ao chorar, mesmo com um sorriso que insiste em não sair do rosto. Foi presa por tráfico de drogas.
Salas, quartos e varandas deram lugar a corredores, alas e celas. Tudo dividido com presos idosos, detidos pela Lei Maria da Penha, doentes crônicos e cadeirantes. 'Novinha' é uma mulher transexual e, assim como ela, 21 dos 138 encarcerados são GBTs (Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais). Todos na Irmã Imelda são de baixa periculosidade. Mulheres lésbicas e homens transexuais são encaminhados a Unidades femininas.
"Essa separação é importante pois, se não, como homens trans iriam ser protegidos de estupros coletivos? Sabemos que a Sejus tem ouvido a população LGBT do Sistema Penitenciário, mas não basta só ouvir enquanto demandas individuais. O que tem de ser feito é transformar essas demandas em políticas públicas para esse público nessa situação", ressaltou a vice-presidente da União Nacional LGBT, Silvinha Cavalleire.
Estes cinco públicos precisaram se separar dos demais por serem considerados vulneráveis no Sistema Prisional comum. "Esses perfis aqui alojados, quando em um Sistema normal, são os primeiros a serem ameaçados", revela a diretora da unidade prisional, Lídia Canuto. O Governo do Estado percebeu essa problemática durante uma série de rebeliões ocorridas em maio de 2016 no Ceará. Na ocasião, 14 presos foram mortos.
À época, 'Novinha' era custodiada na Casa de Privação Provisória de Liberdade Professor José Jucá Neto (CPPL 3). Saiu por meio de um buraco na parede, cavado com a ajuda de outras detentas. Antes da Irmã Imelda, esteve em outras três moradas com grades. O cotidiano hoje se resume a lágrimas derramadas por saudade da família, que vê uma vez por semana, e a alegria ao mostrar as unhas pintadas no estilo "filha única".
Para Silvinha Cavalleire, ainda falta avanço. "Elas e eles são bem tratados e respeitados. Mas a medida ainda precisa avançar muito, porque profissionais do Sistema Carcerário necessitam de formação em Direitos Humanos, para que garantam os direitos desses ingressos no Sistema Penitenciário", frisa.
No entanto, Lídia Canuto destaca que os agentes do local são bem capacitados por rodas de conversa e debates. 'Novinha' não tem do que reclamar. "Aqui me sinto aliviada. Todo mundo me entene. Aqui eu posso me maquiar", revela, exibindo as três tatuagens que possui, todas feitas dentro da Cadeia. Uma delas com o nome de um ex-namorado, que inclusive foi quem pagou pelos desenhos.
Usando o tempo
A permanência na unidade prisional varia. Uns são condenados a 20 meses, outros a 14 anos. A única certeza é a lentidão do tempo, mesmo com o canto dos pássaros, que recebem água direto dos detentos, ou com a horta desenvolvida em parceria com o projeto Farmácia Viva da Universidade Federal do Ceará (UFC). Há ainda teatro, dança, salão de beleza, biblioteca e sala de aula (onde são oferecidos ensinos fundamental e médio).
Esses ambientes possibilitam um grande bônus. No espaço de leitura, um livro lido por mês reduz quatro dias na pena. Na confecção de bolas de couro (doadas pelo Governo às escolas do Estado), cada três dias de trabalho reduz um dentre os que ainda separam os detentos da sonhada liberdade.
Compreensão
"Não tenho do que reclamar. Aqui me sinto aliviada. Todo mundo me entende. Aqui eu posso me maquiar"
'Novinha'
Detenta Trans
Um médico visita a Instituição duas vezes por semana, a fim de intervir adequadamente no tratamento hormonal para os transgêneros. Sem isso, elas e eles podem se submeter a tentativas indiscriminadas, oferecendo danos ao próprio corpo e mente.
Para Lídia Canuto, as atividades instigam a proximidade entre os presos. "É a forma para que eles se desentendam menos. Depois que as alas se misturaram, percebemos uma redução de brigas, de desavenças. As ações são pensadas por perfis. Às vezes só para as meninas, mas as que mais importam são as que eles participam juntos".
Relações
Viver enclausurada não significa viver sozinha. Pelo menos não para 'Novinha'. Somente na Irmã Imelda, ela teve quatro relacionamentos. O sol que banha o corpo cansado de esperar pela soltura, às vezes, é compartilhado com detentos de outras alas. E é então que surge o interesse. O possível casal precisa se comunicar com a assistência social da unidade e indicar o desejo de união. Com autorização, os dois passam a dormir na mesma cama e a sonhar juntos com o futuro longe das trancas.
As regras não são poucas. O horário é metódico. O café sai antes das 7h da manhã. Às 11h todos retornam às celas. Entre uma e quatro da tarde saem novamente e os corredores da Penitenciária se pintam de laranja, cor do uniforme. Uns arriscam um tempo de cooper na área limitada de lazer, outros aproveitam para cobrar: "Cadê o oculista, dona Lídia? Tô ceguinho!".
As visitas também são regradas. As mulheres (esposas, namoradas, mães e filhas) podem entrar na Penitenciária aos sábados. Nos domingos, o afago fica por conta dos homens. Apenas três familiares se cadastram no sistema de visitas. Se mais um entrar na lista, outro sai. (Colaborou João Duarte).
Fonte: DN

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